Os relatos dos milagres de Jesus apresentados pelos diversos evangelistas nos contam não apenas os feitos extraordinários, como nos falam das reações provocadas. É o que podemos atentar na narrativa a seguir, registrada em Mateus capítulo 9, versos 27a 32:
27 Saindo Jesus dali, dois cegos o seguiram, clamando: “Filho de Davi, tem misericórdia de nós!”
28 Entrando ele em casa, os cegos se aproximaram, e ele lhes perguntou: “Vocês creem que eu sou capaz de fazer isso?” Eles responderam: “Sim, Senhor!”
29 E ele, tocando nos olhos deles, disse: “Que lhes seja feito segundo a fé que vocês têm!”
30 E a visão deles foi restaurada. Então Jesus os advertiu severamente: “Cuidem para que ninguém saiba disso”.
31 Eles, porém, saíram e espalharam a notícia por toda aquela região.
32 Enquanto eles se retiravam, foi levado a Jesus um homem endemoninhado que não podia falar.
33 Quando o demônio foi expulso, o mudo começou a falar. A multidão ficou admirada e disse: “Nunca se viu nada parecido em Israel!”
Há duas maneiras apenas de tomarmos conhecimento da ocorrência de um milagre: uma é termos sido os beneficiários dela ou estarmos tão próximos de quem foi beneficiado que podemos sem dúvida testemunhar que o de fato aconteceu, porque presenciamos. A outra maneira é através do testemunho direto dos beneficiados, ou pelo testemunho retransmitido por quem as ouviu. É pela retransmissão que tomamos conhecimento dos milagres de Jesus Cristo, pois os sabemos pela leitura de seus registros nos evangelhos. Um de seus autores, João, se preocupou em certificar o que ele relatava,como lemos no final de seu Evangelho, capítulo 21, verso 24:
“Este é o discípulo que dá testemunho dessas coisas e as registrou. Sabemos que o seu testemunho é verdadeiro”.
Inspirados na preocupação que João demonstrou em validar o que relatava, devemos considerar a nossa responsabilidade com o testemunhar de milagres.
Pensemos na testemunha em termos judiciais. Diante do tribunal: a função da testemunha é atestar a veracidade de certos fatos e principalmente de como eles ocorreram. É com base no depoimento das testemunhas trazidas à sua frente que o juiz construirá a sua compreensão da verdade, verdade que orientará a sentença que ele deve estabelecer. De fato, a verdade mais se cristalizará quanto mais claros e mais numerosos forem os testemunhos. Se, por outro lado, os testemunhos forem contraditórios e contestados, chegar à verdade dos fatos se torna uma empreitada muito desafiadora. É só por aquilo que a testemunha falar é que se torna possível conhecer a verdade do ocorrido; o comprometimento da testemunha com a verdade é condição indispensável para que isso aconteça. O que é válido na esfera judicial é igualmente válido ao se tratar de milagres.
Pensemos um pouco no milagre lido ao início. Os dois cegos já tinham ouvido falar de Jesus, e quando perceberam a proximidade dele, os cegos clamaram por misericórdia. Jesus testou a fé deles e em seguida os curou. A surpresa fica por conta da ordem clara de Jesus a eles: “Cuidem para que ninguém saiba disso”.
Não sabemos o motivo de tal ordem. Para alguns, Jesus não queria que a sua fama se espalhasse mais do que já se espalhava, para que ele tivesse o tempo necessário para concluir seu ministério; para outros, Jesus estaria usando um tipo de psicologia reversa, proibindo-os, mas já sabendo que eles não respeitariam a proibição e testemunharia muito a respeito de Jesus e seu poder. O que não constitui surpresa é a atitude daqueles que antes cegos agora não conseguem se conter na sua excitação e espalham a notícia por todos os recantos. Eles foram testemunhas fiéis e vibrantes do milagre que lhes beneficiou: não se calaram e contaram a verdade. São estes valores que encontramos no comportamento dos cegos que devem também estar no nosso testemunho dos milagres.
A verdade é um atributo difícil de ser preservado no testemunho. É grande a tentação de desejar tornar os fatos maiores, mais vistosos do que realmente foram; há a ânsia, naturalmente compreensível, de desejar aparecer bem na foto; pode existir um alguém que mesmo inconscientemente se quer preservar ou livrar; e em termos espirituais pode surgir aquela motivação íntima de querer se mostrar superior porque foi objeto de uma intervenção maior ou mais frequente de Deus. Quanto precisamos ser testemunha fiéis da graça de Deus que vimos e fomos beneficiados!
Levando em conta todos os perigos tentadores que rondam o testemunho, não podemos, porém, esquecer-do outro atributo, o de não se calar. Falar dos milagres verdadeiros que nos atingiram e dos que foram a nós testemunhados é muito mais do que senso de gratidão. É anunciar a glória de Deus; é proclamar a sua Justiça e o seu Nome. É a nossa contribuição para que o objetivo final dos milagres se realize: fazer Deus ser conhecido.
É assim que somos chamados a testemunhar dos milagres: com seriedade e com alegria; com louvor e com comprometimento da verdade; com insistência e com gratidão. Juntemos as nossas vozes às do salmista quando ele orou:
“A minha boca falará sem cessar da tua justiça e dos teus incontáveis feitos de salvação. Falarei dos teus feitos poderosos, ó Soberano Senhor; proclamarei a tua justiça, unicamente a tua justiça.”[Salmos 71.15-16]
“Deem graças ao Senhor, proclamem o seu nome; divulguem os seus feitos entre as nações. Cantem para ele e louvem-no; relatem todas as suas maravilhas”. [Salmos 105.1-2]
“Senhor meu Deus! Quantas maravilhas tens feito! Não se pode relatar os planos que preparaste para nós! Eu queria proclamá-los e anunciá-los., mas são por demais numerosos!” ... “Eu proclamo as novas da justiça na grande assembleia; como sabes, Senhor, não fecho meus lábios.” [Salmos 40.5&9]
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